05/10/2010

Luíza

Di Cavalcanti

Luzia andava nas calçadas e os olhos dos homens sintonizados no gingado das cochas dela... trazeiro arredondado, feito banda de limão na caipirinha com feijuca de domingo. Luzia de vestido estampado, sempre curto, sorriso maroto e rabo de cavalo em dia de sol. Luzia, jeito angelical, rosto de fada em corpo de mulher. Seus encantamentos, mais do que varinhas de condão acendiam os olhos até dos moleques que jogavam futebol enquanto a moça volta do supermercado. Luzia professora de catecismo, funcionária da lanchonete do Romão. Até ele galanteava a moça, pontualmente ás 22:15, sempre após os expediente.
Mas Luzia era apaixonada por seu João Paulo, dono da drogaria, ficava excitada toda vez que lhe vendia um antibiótico, já ia logo perguntando pelo composto só pra ver o bendito falar... le-vo-flo-xa-xi-no!
-É esse mesmo! Ai ai como achava bonito... Tanto nome de coisa, tanta serventia , que mesmo quando em saúde de anjo passava lá só pra comprar um analgésico... pa-ra-ce-ta-mol. Era o seu preferido. Acontece que seu João Paulo era prometido de Dona Dorinha, filha do dono da lotérica, que era para ter sorte no jogo e quem sabe um dia se tornar milhonário. Uns dizem que foi promessa, outros, praga de mãe, muita gente acha q é por interesse e o coração de Luzia só acha uma pena.

28/01/2010

Luna

(Bryan M. Viv

Luna saiu sozinha naquela noite. Na bolsa apenas algumas notas, o cartão do banco, o batom vermelho,dois maços de cigarro, cinco cápsulas de ilusão. No corpo o bom e velho vestidinho preto, pernas a mostra e jaqueta de couro para aquecer o peito. O tilitar do salto no cimento acompanhava a mente na velha canção da Nico: All tomorrow's parties...
Caminhava com desdém, as noites no centro eram tediosas e bestialmente negras feito um velho bolachão riscado. Sempre as mesmas caras, os adolescentes na calçada enchendo o rabo pra esquecer da vida e ela que sentia-se tão intesamente triste, solitária não se lembrava mais para onde estava indo. Olhou à esquerda e encontrou um bar aberto, pessoas com cara de mais de trinta, nenhuma confiabilidade: entrou e direto no balcão pediu o drink mais forte do menu. Goles agressivos, a velha ida ao banheiro, gestos mecânicos e auto-destrutivos, sai na calçada pra fumar uns cigarros e assim segue boa parte da noite sem que pareça estar sendo notada. E ela desejava realmente não ser, embora seu jeito ímpar de caminhar porta a dentro fosse irremediavelmente observado por noventa por cento dos homens. Doses mais tarde, alguém senta-se alí ao lado e começa o péssimo interrogatório sobre as coisas da vida e tudo mais que a arranncou de casa para não pensar. Enclausurada internamente conduzida pelos próprios devaneios...
Dá-se conta de um conhecido passando pela rua, olha o esmalte descascado de sempre, pensa no tempo, vê as manchas de álcool no balcão, o slogan no avental da garçonete e torce para que o idiota lhe deixe em paz. Não se pode achar a paz no inferno.Responde com verdadeiro ódio as perguntas do infeliz desavisado. Tem horas que a gente deveria sair de casa com um daqueles ícones do msn na testa: AUSENTE.
Cara de looser (pensa), ela sabe bem quem são esses tipos a procura de sexo fácil com fêmeas embreagadas àquela altura da madrugada. De repente o telefone vibra: linceça!
Sai andando na rua com o demônio na mão, as pernas trêmulas, um lapso de vida. Faz sinal para o táxi e vai em busca do bom e velho purgatório: o sexo quente, a alma gélida e aquele olhar evazivo que para sempre lhe amputara o riso.